14 de julho de 2009

CMVM defende que os auditores devem mudar de sete em sete anos

É impressão minha ou quando pagamos a alguém para fiscalizar a nossa própria empresa estamos a garantir que a fiscalização não é muito "fiscalizadora"? Será provavelmente conselheira, mas dificilmente será incómoda.
Passa-se com as empresas de auditoria o mesmo que com as restantes: lutam para conquistar os clientes e quando o conseguem tentam, evidentemente, mantê-los.
O que o bom auditor faz então é aconselhar o cliente a corrigir as situações irregulares que, ainda que sejam ilegais, não serão denunciadas. O cliente pouco escrupuloso saberá portanto qual a parte das irregularidades que deve ser corrigida ou ocultada - é aquela que foi visível para os auditores, pois é aí que reside o risco de ser apanhado.
Na sequência do inquérito ao caso BPN, vários actores políticos exigiram a demissão do Governador do Banco de Portugal.
Claro que o desempenho do Banco Central neste caso é muito relevante, mas mais importante é reflectir sobre o sistema de supervisão e, acrescento eu, também o de auditoria.
Mas nesta matéria foram já muito poucos os que defenderam mudanças substantivas. A CMVM vem agora tapar o sol com a peneira com uma proposta pífia.
Não será a mudança de empresa de auditoria de sete em sete anos, como agora a CMVM vem sugerir, que melhorará o sistema de supervisão e auditoria. Só será eficaz quando essa mudança coincidir com a eleição de uma nova administração que entre em ruptura com a anterior e queira revelar os erros dos seus antecessores.
Sem a mudança do lado do cliente, a troca de auditores de pouco servirá, pois os novos auditores poderão tornar-se incómodos para os seus clientes se pretenderem fazer averiguações muito profundas. Se os interesses do cliente se mantêm os mesmos, os auditores respeitarão isso.
Acresce que uma empresa de auditoria que cause dificuldades a um dos seus clientes correrá também o risco de não conseguir arranjar mais clientes novos: quem é que quer contratar auditores que sejam "demasiado exigentes"?
O sistema de auditoria tem portanto de mudar, mas radicalmente, não com tibieza. E a forma mais eficaz de o fazer é através da criação de novos incentivos.
Hoje as empresas de auditoria são incentivadas a agradarem aos seus clientes. No futuro elas devem ser incentivadas a agradarem aos supervisores, que representam o estado e, portanto, o bem comum.
Os auditores deverão, portanto, passar a ser nomeados pelos supervisores (CMVM, Instituto de Seguros de Portugal, Banco de Portugal, etc.), que lhes pagarão pelo trabalho prestado. Por sua vez, as empresas auditadas pagarão ao supervisor uma taxa de auditoria, em função de vários indicadores como a sua dimensão, volume de negócios, complexidade do sector de actividade, etc.
Esta é uma mudança que poderá melhorar muito qualidade das auditorias realizadas, pois agirá sobre a principal vulnerabilidade das mesmas - o conflito de interesses que emerge de fiscalizar o cliente.
Tem de ser feita à escala mundial? Certamente que sim, mas tem de começar por algum lado e Portugal é um óptimo local para esse início: um país pequeno, com uma economia relativamente moderna e aberta ao exterior.
O nosso país não tem de ser um actor irrelevante no panorama económico mundial. Pode marcar a agenda económica e política, apontando caminhos para a correcção das distorções do sistema económico.

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