31 de janeiro de 2011

A lembrar o 25 de Abril

O exército diz que não usará a força contra os manifestantes no Egipto.

Em comunicado, os militares disseram "A presença do Exército nas ruas é para vosso bem e para assegurar a vossa segurança. As Forças Armadas não vão recorrer ao uso da força contra o nosso grande povo”. “As vossas Forças Armadas, que estão cientes da legitimidade dos vossos pedidos e que estão dispostas a assumir a sua responsabilidade na protecção da nação e dos seus cidadãos, afirmam que a liberdade de expressão através de meios pacíficos está garantida para todos”.

Conclusão: o regime vai cair! A única questão é como. Hosni Mubarack vai conseguir negociar a transição ou vai acabar por ter de fugir do país, como aconteceu na Tunísia.
Se negociar já, pode conseguir um processo de transição pacífico, marcando eleições a que não se candidate. Se persistir no braço-de-ferro, acabará por ter de fugir, pois a declaração dos militares veio liquidar o medo que os cidadãos tinham do regime.
Agora quem deve ter mais medo é Mubarack.

28 de janeiro de 2011

Contestação na era digital

Depois da revolta na Tunísia, noutros países muçulmanos do Norte de África e península arábica surgem fortes movimentos de revolta.

Estamos perante um dos mais promissores efeitos da era digital: o aumento do poder dos cidadãos. A internet, o facebook, o twitter e todas estes novos meios de comunicação têm uma maior capacidade de fugir ao controlo da censura estatal do que os meios de comunicação social.

Apesar de haver Estados que conseguem censurar os conteúdos que os cidadãos consultam ou colocam na internet, como a China e Cuba, por exemplo, esse controlo é muito mais difícil do que o que é feito sobre a comunicação social. E isto por dois motivos: desde logo, porque requer mais recursos, humanos e tecnológicos; depois, porque quando se controla as televisões, rádios e jornais, está-se a controlar algumas centenas de pessoas, que se não obedecerem vão para a prisão. Mas para controlar a internet seria preciso prender muitas mais.

Que ninguém pense, porém, que a contestação se pode confinar aos meios digitais. Pelo contrário, é necessário dar expressão de massas à contestação. E isso só se consegue nas ruas. A internet aproxima-nos, porque comunicamos mais, mas também nos pode afastar, se ficar cada um em sua casa agarrado ao computador. E o totalitarismo só se sente ameaçado quando os cidadãos se unem contra ele.

16 de janeiro de 2011

A questão do cinto de segurança ou o compromisso entre liberdades e obrigações

Num eloquente argumento a favor da liberdade individual, Javier Gomá Lanzón escreveu (Babélia, El País) em 6 de Novembro passado, “¿Qué bien social está reglamentando la norma que declara ilícito el incumplimiento del deber de abrocharse el cinturón de seguridad? Ninguna: está velando exclusivamente por mí y no pretende proteger interés general alguno”.

O autor considera que esta imposição representa a imposição de um paternalismo estatal, uma imposição do estado à nossa vida privada, um uso totalitário da lei, quando a opção de usar ou não o cinto de segurança apenas afecta a nossa vida privada. Além da despesa pública resultante das consequências dos acidentes, claro está. E, relativamente a estas, Javier Gomá Lanzón estabelece um paralelismo com outras opções individuais, desde a ausência de hábitos saudáveis como ir ao ginásio ou beber com moderação até à procriação, por resultarem em gastos públicos futuros. E remata: “No: si mi libertad genera perjuicios, incurriré en la responsabilidad que proceda”. Como se tudo se resolvesse com dinheiro.

A vida em sociedade implica regras, que podemos não conhecer ou sequer aceitar, mas que nos afectam. Para o bem e para o mal. Uma delas é a obrigação de socorro. Ou será que por alguém optar por não usar o cinto de segurança está a desobrigar os outros dessa obrigação? Poderá um médico, paramédico, enfermeiro ou qualquer outro cidadão passar por um acidente na estrada e dizer “não levava cinto de segurança? Então não tenho de parar para o ajudar”? Ou poderão no hospital dizer “é um caso grave, mas como não levava cinto de segurança tratamos primeiro dos feridos ligeiros”? Ou, porque estas obrigações não se aplicam apenas aos automobilistas, poderão os serviços de socorro a náufragos dizer “não levava colete salva-vidas? Então não me vou arriscar a tentar salvá-lo. Fico a ver o jogo de futebol”?

A comunidade em que vivemos estabelece direitos e obrigações para todos os indivíduos, realizando compromissos entre liberdade e responsabilidade. Assim, se sofrermos um acidente, temos o direito de ser ajudados por quem tenha a possibilidade de o fazer; e para usufruirmos desse direito alguém tem uma obrigação correspondente. Não se trata apenas de “si mi libertad genera perjuicios, incurriré en la responsabilidad que proceda”. Trata-se, isso sim, de a comunidade assegurar a cada indivíduo direitos que têm implicações sobre os demais. E, correlativamente a esses direitos, exigir determinados comportamentos.

Voltando à questão de Javier Gomá Lanzón: porque não proibir também a ausência de hábitos saudáveis, como praticar desporto, por exemplo? Porque, no difícil equilíbrio entre liberdades e obrigações, a comunidade (pelo menos a maioria dela) tem entendido que a restrição da liberdade individual apenas é admissível quando o transtorno que provoca ao próprio está muito aquém das consequências que o comportamento proibido teria para os outros.

Obrigar as pessoas a praticar desporto ou a andarem mais a pé para serem mais saudáveis produziria certamente benefícios para a sua saúde, mas implicaria uma mudança significativa nas suas vidas. E mantemos, portanto, a liberdade de não o fazer. Vamos então de carro. Desde que o cinto de segurança vá bem apertado.

14 de janeiro de 2011

FMI, o amigo.

Depois da grande questão nacional, que todos sabemos ser o homicídio de Carlos Castro, dedicamo-nos a dar palpites sobre se o FMI vem ou não vem para Portugal.

Em termos ideológicos, o FMI está perto do PSD de Passos Coelho. Mas Passos Coelho vive em Portugal, pelo que não pode defender publicamente aquilo que pensa.

Queria rever a constituição para acabar com a proibição de despedimentos sem justa causa, mas percebeu que isso o poderia fazer perder as eleições; e mudou o discurso. Queria privatizar a Caixa Geral de Depósitos, mas a crise financeira tornou evidente a importância de manter o banco Público; e, também aí, mudou o discurso.

Mas não mudou as ideias. Mas se viesse alguém impor essas medidas...