10 de setembro de 2009

Portugal num relance

A Revista Visão de hoje traz um interessante dossier que pretende fazer um retrato-síntese da situação de Portugal em diversas áreas, como a educação, a saúde ou a ciência. Trata-se de uma leitura interessante, que nos permite ficar com uma ideia geral acerca da situação do país em algumas das áreas mais interessantes.

Ficamos assim a saber que, apesar de em algumas das áreas estarmos muito mal (por exemplo, os portugueses estão cada vez mais endividados), há outras em que se têm registado excelentes progressos, destacando-se as áreas sociais e a saúde.

Mas no melhor pano cai a nódoa.

No capítulo dedicado à administração pública surge um título: Públicos e bem pagos. Aí refere-se, em destaque, que os funcionários públicos auferem um ordenado médio 73% superior ao do resto da população (dados de 2005). Esta informação parece um bom argumento para sustentar a ideia de que os funcionários públicos são uns priveligiados. Não digo que o sejam ou não (provavelmente sim em algumas coisas e não noutras). O que digo é que estes dados não contribuem para essa análise, pois comparam universos com formações académicas muito diferentes, dado essencial quando se comparam remunerações.

É que no mesmo dossier, uns quadros mais à frente, vemos que 49% dos funcionários públicos tinham em 2005 formação superior. E uns quadros mais atrás podemos ler que em 2007 só 12% dos portugueses tinham curso superior.

Uma análise esclarecedora compararia os salários para cada nível de escolaridade. Apresentar os dados sem essa análise e fazer títulos como os apresentados serve mais para desinformar do que para esclarecer.

4 comentários:

  1. Bom...confesso ter uma tendência para, quando se fala em "funcionário público", pensar automáticamente nas pessoas que estão atrás dos balcões e "guichets" de uma Repartição de Finanças. É claro que Médicos, Professores, Ministros, Deputados, etc...também são funcionários públicos e nesse sentido, não é difícil acreditar que aufrirão melhores salários e/ou regalias(pelo menos percentualmente) já que o Estado é o maior empregador. E nesse sentido também, é no Estado que percentualmente, existirão ao seu serviço (nosso?!) mais trabalhadores com Cursos Superiores.
    Seria também interessante, saber o nº de funcionários públicos (com ou sem formação superior) que terão vínculo precário (recibos verdes) e se estes terão contribuido para o estudo publicado.

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  2. Não sei o número de pessoas a trabalhar a recibo verde para o estado, mas no ano passado o BE dizia serem 117 mil. Seja este número ou menos, serão sempre muitas.
    Sobretudo porque na maioria dos casos tratam-se de falsos recibos verdes, ou seja, pessoas que ocupam um posto de trabalho permanente, mas que não foram contratadas como trabalhadoras, mas sim como prestadoras de serviços, o que é ilegal.
    O governo confirma que se mantêm muitos casos ilegais, mas que de 2005 até agora conseguiu reduzir em 30% o número de pessoas a recibos verdes no estado, sobretudo através da abertura de concursos para contratar pessoas para os postos que identificou como permanentes em que estavam colocados trabalhadores a recibo verde.
    Poderíamos pensar que isso iria aumentar o número de funcionários públicos, mas como foi estabelecida a regra que faz com que só entre um por cada dois que saem (geralmente por reforma), na verdade o número de funcionários diminuiu de 755 mil em 2005 para 695 mil neste ano.
    Finalmente, não, o estudo salarial não inclui as pessoas a recibo verde. A meu ver, se assim fosse, o valor médio da remuneração na função pública iria baixar, pois o salário médio de quem está a recibo verde é geralmente baixo, só costumam receber 12 meses (e não 14, como é norma para os restantes) e ainda por cima têm de pagar a segurança social exclusivamente do seu bolso (quando para os outros trabalhadores o custo é partilhado com a entidade patronal, que paga a maior fatia).
    Um abraço,

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  3. Sendo uma análise feita pela VISAO, acho que será sempre uma análise tendenciosa!
    E estará sempre tudo mal, lá está

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  4. As ideologias atingem a sua maturidade quando não são sequer questionadas pelos seus aderentes.

    Reparem como a discussão tem por pressuposto que se os funcionários públicos (seja lá isso o que for) ganham mais que os privados (idem), então é porque ganham demais e deviam passar a ganhar menos. :)

    Alguns economistas dirão exactamente isso, sem tirar nem pôr, e apresentarão argumentos nesse sentido. Falarão de produtividade, de mercado, de eficiência, de concorrência... E tudo tão dentro de uma mesma forma de pensar!

    Questão para diversificar o debate:

    Imaginemos que na nossa casa se decide (de um qualquer modo) colocar uma cortina na sala. É necessário seleccionar e comprar o tecido e o varão e os parafusos. É necessário coser e esburacar e aparafusar. O trabalho e o financiamento são repartidos pelos elementos da família. O resultado também é desfrutado pelos elementos da família. Uns trabalham mais, outros menos. Uns desfrutam mais, outros menos. Mas entendem-se.

    Numa empresa ou instituição pública as pessoas trabalham em conjunto para atingir um fim. Trabalham de forma desigual e usufruem do resultado de forma desigual. Tal como nas suas casas. Infelizmente, parece que não se entendem tão bem acerca disso nas empresas ou instituições públicas como em casa.

    Será que isto é mais uma daquelas coisas que "é assim e não há nada a fazer"?
    (bem sei que se poderiam escrever livros inteiros acerca disto, mas apeteceu-me!... :) )

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