7 de outubro de 2009

A fragmentação da direita

(Artigo de opinião escrito por HB antes das eleições, mas só publicado no Diário de Notícias após as mesmas - no dia 3 de Outubro).

Ao longo da curta história da democracia portuguesa fomo-nos habituando a ver o espaço político da esquerda ser disputado por numerosos partidos. Além do PS e do PCP (coligado com Os Verdes), encontrávamos um grande número de pequenos partidos. Como é conhecido, há dez anos, a fusão da UDP com o PSR e a Política XXI deu origem ao BE, corolário de uma reorganização da esquerda que tinha já levado ao desaparecimento da maioria dos pequenos partidos surgidos após o 25 de Abril.

Por outro lado, a direita surgia sempre agregada em torno dos seus dois principais partidos, ainda que episodicamente surgissem candidaturas autónomas do PPM, MPT ou outros, mas que, ao contrário do que sucedia à esquerda, não conseguiam afirmar claramente o seu espaço ideológico, que era absorvido ora pelo PSD ora pelo CDS.

Assim, durante muitos anos, tirando o aparecimento de um partido de extrema-direita (o PNR) e de um outro resultante do melindre de Manuel Monteiro com o seu antigo amigo Paulo Portas (o PND), nada de novo parecia acontecer na direita portuguesa. A hegemonia ideológica dos seus dois maiores partidos, em que o CDS fixava o eleitorado mais conservador e o PSD abarcava tendências sociais-democratas, liberais e conservadoras, não deixava espaço para surgirem mais partidos.

Porém, a partir dos governos de Durão Barroso e Santana Lopes começaram a esboçar-se factores que propiciaram o aparecimento de novos partidos.

Em termos ideológicos, a coligação do PSD com o CDS iniciou a aproximação entre estes. Apesar de a tendência ter sido interrompida durante a liderança de Marques Mendes, a actual direcção do PSD veio reafirmá-la. Manuela Ferreira Leite imprimiu ao partido uma orientação mais conservadora, levando a que os sectores social-democrata e liberal se sentissem pouco identificados com as suas posições.

Em termos de organização e mobilização, a campanha pelo “não” no referendo à Interrupção Voluntária da Gravidez funcionou como elemento catalizador, pois muitas das pessoas que participaram nessa campanha sentiram vontade de manter a sua participação cívica mas não se identificavam com o PSD nem com o CDS.

Surgem então três novos partidos a disputar os votos da direita, o Movimento Esperança Portugal (MEP), o Movimento Mérito e Sociedade (MMS) e o Portugal Pró Vida (PPV), cada um deles correspondendo a um espaço ideológico que o PSD e o CDS deixaram vago quando se aproximaram ideologicamente.

O MEP apresenta-se ao eleitorado com um discurso que conjuga uma perspectiva de intervenção social-democrata com uma visão democrata-cristã da sociedade (que era o posicionamento ideológico do CDS até ao início dos anos 90). Com fortes possibilidades de eleger deputados nestas eleições, passará a representar uma linha política que estava desaparecida do espectro partidário desde que Manuela Ferreira Leite se tornou líder do PSD e impôs uma orientação política mais conservadora, a social-democracia de direita, o que lhe confere um bom espaço de crescimento futuro.

O MMS propõe algumas medidas de orientação liberal e outras de cariz social-democrata. Disputa os eleitores que se identificariam mais com um PSD liderado por Pedro Passos Coelho do que por Manuela Ferreira Leite. Independentemente do resultado que obtiver nestas eleições, poderá tornar-se a voz das correntes liberais na sociedade portuguesa.

O PPV representa a direita católica mais conservadora. Apresentando-se a estas eleições como um partido quase “monotemático”, concentrado no combate à lei da Interrupção Voluntária da Gravidez, não deverá conseguir captar muitos eleitores. Mas evidencia que existe um espaço político por preencher à direita do CDS.

A criação destes partidos não é circunstancial. É uma consequência do afunilamento ideológico que marcou a direita nos últimos anos, sobretudo o PSD. Este tornou-se um partido menos plural e os cidadãos encontraram formas de restabelecer o pluralismo político – criaram novos partidos que os representassem.

2 comentários:

  1. Bom artigo, boa reflexão das mentes direitas da nação... contudo já depois das eleições verificamos que quem se dirige às urnas coloca o X tendencialmente nos mesmos .
    Era e é necessário a existência de uma direita inteligente, audaz, com sentido de missão,realista e pró-activa em vez desta que temos: bacoca, reaccionária, tradicionalista, defensiva e demasiado acomodada aos valores e ideais que defende nestes últimos 20 anos ...
    isto para falarmos da direita pois a esquerda não está muito diferente :) falaremos disso num próximo comentário

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  2. Numa visão eminentemente doméstica, a pulverização do espaço político situado à direita da social-democracia -que não, pelo menos a curto prazo, da representatividade eleitoral- tem certamente a sua génese na indefinição ideológica do partido que pressupostamente devia marcar a fronteira com a esquerda e na incapacidade do seu parceiro preferencial para ganhar significativo terreno mais à direita.
    Até a duplicidade das siglas PPD/PSD e CDS/PP são demonstrativas da ausência de pensamento político puro e da aparente auto-glorificação de "partidos do arco governativo".
    Não é de admirar que tradicionais apelos da direita -Vida, Esperança, Mérito, Segurança, Família- estejam em situação de orfandade e se transformem em bandeiras disponíveis à aproriação por novos projectos.
    Acresce que, para além do frentismo de Pacheco e do populismo de Portas, não há indícios de reflexão ideológica capaz de contaminar a lógica de poder pelo poder.
    E restará como mais uma afirmação de "tudo por nada" o apoio conjunto a uma segunda candidatura do professor de finanças pragmático e insondável à presidência da República.
    Abraço

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